(SONS)

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Galinha Progressista

 
Passou por aqui a ignorância travestida de coragem,
armando com fuzis investidas pela cidade apagada.
Ritmavam-se os tiros perdidos embalados pela sorte
como em uma ópera de morte que chega ao seu ponto mais dramático.
O silêncio da noite ressaqueada dilatava as pupilas
dos prédios, das casas, das praças enquanto a soprano debaixo
das rodas da moto fazia o seu solo entre os gritos do vento
nos retrovisores embaçados fumê do Centro Cultural Oscar Niemeyer.

Foram marcadas treze digitais negras de mãos imundas
no cérebro de concreto armado do submundo.
Não tiveram chance de reagir: todos os livros se estremeceram
de cima de suas prateleiras, Drummond, Cecília, Manoel Bandeira,
Guimarães Rosa, Euclides da Cunha, João Cabral de Melo Neto,
Machado de Assis etc. todos foram por um instante mortais.
Na estante escura, sitiada pelo medo, as palavras se tornaram nada,
entrou pelas frestas dos disparos os díspares ares que se conflitam até hoje.

Os tiros aqui cravados há sete anos provam que vidros
não cicatrizam sozinhos. Provam que a espada é mais poderosa que a pena.
São a prova, irrefutável, que em Duque de Caxias a galinha não cisca para trás.
Cisca, sim, para frente, para debaixo de suas asas o vil metal emborrachado
da beira das Rodovias. Essa é a cidade dos pretos líquidos fétidos de ouro de tolo
inflamável, das concessões empoeiradas levadas pelo tempo perdido à sombra do sol,
da eterna ignorância parda em Cieps nojentos como o hálito de um Prefeito
broxa dormindo há duas horas em sua cadeira na Alameda Esmeralda, 206.

segunda-feira, 2 de setembro de 2013

Um homem com futuro


O filho da tristeza não tem passado
e justamente por isso é feliz.
Ele caminha elegante pelas pedrinhas do caminho empoeirado e irregular.
Tem um horizonte de mar à sua porta sem fechadura e um porvir.
Porvir que poucas pessoas terão a chance de ter, culpa do peso que se arrasta.

Como as pedras que caminham eternamente na argila do deserto
e alcançam distancias enormes deixando um rastro, assim nós somos.
Assim somos nós como cavalos com tapadeiras que caminham reto,
focados num objetivo sem objetivo, objetivando o objeto abjeto do nosso desejo.

Sem perceber levamos a vida como as irracionais pedras do Vale da Morte.

Na retidão curva como em Tamburello nos sentimos seguros,
e é justamente ali que morrem os grandes gênios. Na monotonia da curvatura da vida
         reta nos esquecemos das curvas da estrada de Santos.
Se esquece do risco, se esquece da faixa, se esquece de tudo.

         E talvez aí no esquecimento resida a maior felicidade de um homem.
Esquecido do seu passado e ainda tonto ele apenas se senta acende um cigarro
                                e pensa no que irá preparar para o jantar.

sexta-feira, 21 de junho de 2013

Così fan tutte


Ela escreveu o meu nome
com seus dedos
na janela úmida e me beijou mentalmente.

Seu sorriso era a metalinguagem que dizia, vem!

Ela suspirou o meu nome entre os seus lábios,
no escuro frio das primeiras duas poltronas,
e eu via escapar a minha chance.

Eu via se aproximar o pedágio,
e via as decepções de outros futuros.

Foi quando numa suspensão do ar eu a beijei,
e foi ali que perdi o meu medo de avião.
E foi a sua mão segurando a minha
       que fez a morte parecer simples.

E foi a intensidade deste momento que me fez
ter a coragem de escrever um poema.

Ela dizia ter o sonho de amar por amor,
de fazer uma revolução com cores de primavera
e quereria mais alguma coisa que no momento não me recordo.
A única certeza que tenho é a dos seus olhos de azeviche brilhando de molhados
confirmando a certeza do poema que é seu. E é seu o poema, digna de ser amada!
E eu, apenas um filho de Jeffrey, tenho também a certeza que mentalmente 
estará declamando poemas bonitos a mim,
pois o mundo também lhe é preto e branco.

domingo, 30 de dezembro de 2012

Não só de poesia vive esse blog aqui!




Santinhos pisados


Olhei a lua tempo bastante
pra perceber que nós estamos nos movendo,
tive tempo largo pra contemplar e constatar
que estamos fedendo. Isso não é extraordinário?
--Ainda não, respondem. E sem cerimonia
despejam em transparente negro
o colorido dos excrementos dos fundos de nossas casas.
Tive tempo bastante para, com todos os sentidos,
experimentar o que produz o cérebro nas ruas.
E ver o monumental templo vaticinando pelo comodismo
escalar as paredes e as calçadas como trepadeiras.
                               
                              O povo teve o que tem
                                        que ser dado ao povo: lixo!

                                E nada mais justo ter o pus da ferida    
                                                     tão interno, tão orgânico,
           tão votar do chão números de santinhos pisados.

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Pequena homenagem a Luiz Gonzaga


 
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